Cancro de mama
As células crescem, dividem-se e desenvolvem-se, formando novos tecidos que por sua vez formam os órgãos do nosso corpo, no seu ciclo vida, envelhecem, morrem e são desenvolvidas novas células. O cancro é caracterizado pelo desenvolvimento de células sem que o organismo necessite. A este conjunto de células dá-se o nome de tumor. O nome dado à maioria dos cancros, refere-se à localização do tumor inicial, no caso a proliferação anormal de células da mama (Liga Portuguesa Contra Cancro, 2019).
O cancro de mama é o mais frequente cancro diagnosticado à mulher a nível mundial (Devoogdt et al., 2018; Pillai et al., 2019), tanto em países desenvolvidos como em países em desenvolvimento (Lahart et al., 2014). Em Portugal, o cancro da mama é o mais comum (27.1%), com uma taxa de mortalidade de 6%, muito possivelmente devido a um crescimento e envelhecimento da população, como também a uma maior exposição a factores de risco (IARC, 2019).
Depois do diagnóstico de cancro de mama, os médicos tentam descobrir, se este se espalhou e se sim, qual a extensão ou estádio. O estádio do cancro descreve a quantidade de cancro existente no corpo, ajudando a determinar a gravidade do mesmo e a melhor forma de o tratar. O estádio do cancro é também utilizado para aferir as taxas de sobrevivência (American Cancer Society, 2019).
O cancro de mama é classificado segundo a classificação dos tumores malignos (TNM). Este sistema descreve a extensão anatómica da doença, baseando-se na avaliação de três componentes: o tumor primitivo (T), a ausência ou presença e extensão de metástases nos gânglios linfáticos regionais (N) e a ausência ou presença de metástases à distância (M). Relativamente ao tumor primitivo, este pode ser TX quando não pode ser avaliado, T0 quando não existe evidência de tumor primitivo, Tis carcinoma in situ e T1, T2, T3, T4 função progressiva do tamanho e/ou extensão local do tumor primitivo. Relativamente aos gânglios linfáticos regionais, NX quando os gânglios não podem ser avaliados, NO quando não existem metástases a nível gânglionar e N1, N2 e N3 função progressiva do envolvimento dos gânglios linfáticos regionais. Relativamente ás metástases à distância, MX se a presença de metástases à distância não pode ser avaliada, MO na ausência de metástases à distância e M1 na presença de metástases à distância (American Cancer Society, 2019).
Nem todos os tipos de cancro de mama podem ser prevenidos. Certos factores de risco como a idade e a história familiar da mulher afectada (historial de cancro e especificamente cancro de mama) não podem ser alterados (Kolak et al., 2017). No entanto existem factores de risco relacionados com o estilo de vida da própria pessoa, que podem prevenir o aparecimento de cancro de mama (IARC, 2019): maus hábitos alimentares, consumo de bebidas alcoólicas, obesidade e falta de exercício físico, idade avançada no primeiro parto e terapia hormonal, constituem factores de risco do estilo de vida, que podem ser alterados (Kolak et al., 2017; Lahart et al., 2014).
Existem vários tipos de intervenções médicas, as mais comuns incluindo a cirúrgia conservadora e a mastectomia, ambas acompanhadas de sessões de radioterapia e braquioterapia (Serra-Añó, Inglés, Bou-Catalá, Iraola-Lliso, & Espí-López, 2019). O efeito secundário imediato e mais comum, deste tipo de intervenção, é o linfedema (Devoogdt et al., 2018) que produz inflamação crónica com uma sintomatologia diversa descrita como edema, desconforto e dor na região do membro superior (Guerero, das Neves, Guirro, & Guirro, 2017). O linfedema é reconhecido como uma condição crónica que se pode desenvolver a qualquer momento após a intervenção cirúrgica (De Oliveira et al., 2018). É causado pela diminuição da capacidade de transporte do sistema linfático, relacionado com a cirurgia ou radioterapia, ou pelo o aumento de linfa no espaço intersticial (Devoogdt et al., 2018). Os outros efeitos secundários descritos após este tipo de intervenção são o desenvolvimento de fibroses ou retrações do tecido conjuntivo derivados da cicatriz, resultado da radiação ou da própria intervenção cirúrgica. A intervenção precoce, nestas situações, pode impedir que a fibrose e as retrações se desenvolvam, de forma a não limitar a funcionalidade da utente (Serra-Añó et al., 2019).
O linfedema pode causar efeitos tanto a nível funcional como psicossocial, levando assim a diminuição da qualidade de vida relacionada com a saúde (Devoogdt et al., 2018; Leduc et al., 2008) e é uma das consequências da intervenção cirúrgica mais receada pelas mulheres
Sistema Linfático e o linfedema
Os sistemas sanguíneo e linfático estão interconectados, por circularem ao lado um do outro (Guerero et al., 2017). O Sistema linfático tem como principal função recolher e eliminar excesso de fluido intersticial, resíduos celulares e fazê-lo retornar ao sistema circulatório venoso, através dos vasos linfáticos. Existem dois tipos de vasos linfáticos, vasos de menos calibre e pré-coletores e os coletores linfáticos para os quais os anteriores drenam (Hsu & Itkin, 2016).
O linfedema em mulheres com cancro de mama é caracterizado pela acumulação de líquido rico em proteínas, que ocorre quando a drenagem linfática axilar do braço é interrompida, devido à dissecação dos linfonodos axilares ou radiação axilar, ou ambos. O linfedema continua a ser considerado um problema, mesmo com as modalidades de tratamento mais recentes. As mulheres afectadas poderão sentir dor, edema do braço, aperto e peso no braço como também infecções cutâneas recorrentes (Harris, Schmitz, Campbell, & McNeely, 2012).
Foram descritos três estadios de linfedema: o estadio um, caracterizado por coceira e considerado reversível (as mulheres que se apresentam neste estádio, não referem aumento da circunferência ou peso do membro superior, nem sinais de edema); o estádio dois, caracterizado pela progressão do estádio um, em que este se torna musculoso e fibrotico, não corrosivo e irreversível; o estádio três, caracterizado por linfedema avançado (endurecimento cartilaginoso, crescimento papilomatoso e hiperqueratose da pele), que raramente ocorre após os tratamentos do cancro de mama (Harris et al., 2012).
Intervenção da Fisioterapia
A intervenção em fisioterapia após o tratamento do cancro de mama é uma etapa muito importante na vida da mulher, tanto a nível físico, como a nível psicossocial. O processo de reabilitação abrange não apenas a reeducação do membro superior, como também o tratamento físico de outros problemas que se podem desenvolver no decorrer da hospitalização ou anos mais tarde (Hwang, Jeong, Kim, & Sim, 2013; Leduc et al., 2008).
A drenagem linfática manual é uma das intervenções mais comuns no mundo da fisioterapia, relacionada com o tratamento do linfedema: não só actua na diminuição do edema, como também na redução da dor e desconforto (Serra-Añó et al., 2019). A Drenagem linfática Manual é também utilizada como forma de prevenção do linfedema, quando utilizada no período pós cirúrgico, estimulando assim os gânglios linfáticos na eliminação da água e proteínas acumuladas no tecido intersticial (Devoogdt et al., 2018).
Após a intervenção da fisioterapia no cancro de mama, o aparecimento prematuro de linfedema pode ocorrer no espaço de três meses após a cirurgia ou posteriormente. Raramente aparece na primeira semana pós operatória podendo ocorrer muito mais tarde (por ex. vinte anos depois) sem motivo aparente (Stout et al., 2012; Leduc et al., 2008). Existem factores de risco associados ao aparecimento do linfedema, muitos deles que podem ser evitados pela equipa de saúde que acompanha a utente: qualquer trauma do membro superior durante ou após a cirurgia deve ser totalmente evitado; qualquer exame ao sangue, perfusão, injecção intravenosa, acupuntura, termoterapia, manipulação de choque e inserção de shunt arteriovenoso, deve também ser evitado do lado operado (Leduc et al., 2008).
Quando a incapacidade relacionada com o cancro de mama acontece, muitas vezes passa despercebida e não é tratada, podendo atingir níveis de incapacidade e função. Por este ser o cancro mais diagnosticado em mulheres e apresentar uma taxa de sobrevivência relativamente alta, é necessário aplicar um modelo abrangente de cuidados de sobrevivência que se concentre em melhorar a função física das mulheres que vivem com cancro de mama (Stout et al., 2012).
Bibliografia
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